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02 junho 2012

manuel antónio pina / aos filhos


  


Já nada nos pertence,
nem a nossa miséria.
O que vos deixaremos
a vós roubaremos.

Toda a vida estivemos
sentados sobre a morte,
sobre a nossa própria morte!
Agora como morreremos?

Estes são tempos de
que não ficará memória,
alguma glória teríamos
fôramos ao menos infames.

Comprámos e não pagámos,
faltámos a encontros:
nem sequer quando errámos
fizemos grande coisa?

1976/1989





manuel antónio pina
um sítio onde pousar a cabeça (1991)
todas as palavras
poesia reunida
assírio & alvim
2012

12 maio 2012

manuel antónio pina / It's allright, ma...









Está tudo bem, mãe,
estou só a esvair-me em sangue,
o sangue vai e vem,
tenho muito sangue.
 
Não tenho é paciência,
nem tempo que baste
(nem espaço, deixaste-me
pouco espaço para tanto existência).

Lembranças a menos
faziam-me bem,
e esquecimento também
e sangue e água a menos.

Teria cicatrizado
a ferida do lado,
e eu ressuscitado
pelo lado de dentro.

Que é o lado
por onde estou pregado,
sem mandamento
e sem sofrimento.

Nas tuas mãos
entrego o meu espírito,
seja feita a tua vontade,
e por aí adiante.

Que não se perturbe
nem intimide
o teu coração,
estou só a morrer em vão



manuel antónio pina




02 dezembro 2011

manuel antónio pina / outras coisas





Outras coisas  no entanto
o amor e o desamor e também a
morte que nas coisas morre subitamente
o lugar onde vais de súbito

De súbito faltas-me debaixo dos pés
e noutros lugares  De ti é possível dizer
que te ausentaste para parte incerta
deixando tudo no teu lugar

Está tudo na mesma  Também a mim
tempo não me falta lugar sim
Onde cairás morta, flor da infância?
De súbito faltam-me as palavras





manuel antónio pina
ainda não é o fim
nem o princípio do mundo
calma
é apenas um pouco tarde
erva daninha
1982

.
.

25 julho 2011

manuel antónio pina / já não é possível

.
.
 
Já tudo é tudo. A perfeição dos
deuses digere o próprio estômago.
O rio da morte corre para a nascente.
O que é feito das palavras senão as palavras?
 
O que é feito de nós senão
as palavras que nos fazem
Todas as coisas são perfeitas de
Nós até ao infinito, somos pois divinos.
 
Já não é possível dizer mais nada
mas também não é possível ficar calado.
Eis o verdadeiro rosto do poema.
Assim seja feito a mais e a menos.
 
 
 



manuel antónio pina
ainda não é o fim
nem o princípio do mundo
calma
é apenas um pouco tarde
erva daninha
1982
 
.
.
.
 

01 março 2010

manuel antónio pina / esplanada








Naquele tempo falavas muito de perfeição,
da prosa dos versos irregulares
onde cantam os sentimentos irregulares.
Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,

agora lês saramago & coisas assim
eu já não fico a ouvir-te como antigamente
olhando as tuas pernas que subiam lentamente
até um sítio escuro dentro de mim.

O café agora é um banco, tu professora do liceu:
Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
e não caminhos de andar como dantes,
chamando do fundo do meu coração.







manuel antónio pina
poemas
encontros de talábriga
1999