Palavras – vidros que infielmente reflectis o meu céu – pensei em vós ao anoitecer numa rua sombria quando sobre as pedras da calçada caiu uma vidraça e durante muito tempo os estilhaços espalharam luz pela terra – antonia pozzi morte de uma estação trad. inês dias averno 2019
Náufragos sobre os escolhos, cada um conta a si mesmo – a história de uma doce casa perdida, a si mesmo ouve falar alto sobre o deserto pranto do mar – Triste jardim abandonado, a alma rodeia-se de selvagens sebes de amores: morrer é este cobrir-se de silvas nascidas em nós. antonia pozzi morte de uma estação trad. inês dias averno 2019
O nevoeiro é de prata, apaga as sombras dos pinheiros: são maiores os jardins ao amanhecer. Uma folha do choupo secou, morreu um ramo do castanheiro no monte. Medos que eles próprios desconhecem dormindo no ar celeste: este fim que regressa todos os anos, que se renova todos os anos. Como a última árvore do bosque, o último homem já contou os mortos: mas a sua morte apanha-o ainda de surpresa. antonia pozzi morte de uma estação trad. inês dias averno 2019
a L. B Apoia-me a cabeça nos ombros: que eu te acaricie com um gesto lento, como se a minha mão acompanhasse uma longa, invisível agulhada. Não só sobre a tua cabeça: sobre cada face que sofra de tormento e de cansaço descem estas minhas carícias cegas, como as folhas amarelecidas do Outono numa poça que reflecte o céu. antonia pozzi um pouco do meu sangue antologia de poesia italiana trad. joão coles contracapa 2020