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09 novembro 2014

özdemir ince / como eclode um poema



Nascer do sol, cigarras, cantos de galo,
barco no porto, ruídos diversos,
Ulker suspira no sono, respiração agitada,
empurras as persianas da varanda; crepúsculo,
colina escura,
casas brancas de arcadas, campos de milho
ao fundo,
figueiras do diabo, salgueiros; um clarão,
um só loureiro,
chilrear de pássaros, ruído de gotas           
a cair na água,
e, sobretudo, a própria voz de Agosto,
que não deixa dormir.
 
Tudo são apenas descrições, observações,                             
quando muito notas para um poema,
que amanhã se repetirão no mesmo momento,
mais ou menos no mesmo minuto,
quer vejas ou não, quer entendas ou não,
e mesmo que não abras a porta da varanda,            
podias dormir, não acordar mais, estar
num barco ou em outra ilha,
imaginar o mesmo acordar sumptuoso,
sem uma só testemunha:
se podes sincronizar o teu sono, o teu olho,
o teu ouvido e a tua insónia.
Assim são apenas notas de viagem,
notas da aurora, observação                                              
de pequenos factos, descrições, sensibilidades
cintilantes,
salvo se não conseguires arrumar na imagem
 rectangular do quadro da janela, sim, precisamente,
as oliveiras perenes e as folhas poeirentas
das figueiras.

O que se chama poesia pode começar                  
pelo odor sufocante da seiva da figueira:
quer dizer que ela depende de ti, do teu olfacto, da tua aptidão para perceber esse odor,
para o reproduzir,
e para transpor, num canto de galo, a tua cidade natal  
para esta ilha;
talvez, então, se possa passar qualquer coisa;
nesse momento, - quem sabe? -
um poema pode começar.
 

özdemir ince
poemas
tradução de egito gonçalves