Andava em busca de uma alma semelhante à minha. E não
podia encontrá-la. Procurava por todos os recantos da terra: era inútil a minha
perseverança. E, no entanto, não podia continuar só. Precisava de alguém que
aprovasse o meu carácter; precisava de alguém que tivesse as mesmas ideias que
eu. Era de manhã; o sol ergueu-se no horizonte em toda a sua magnificência, e
eis que diante dos meus olhos se ergue também um jovem cuja presença gerava
flores quando passava. Aproximou-se de mim estendendo-me a mão: “Vim a ti, a ti
que me procuras. Bendigamos este dia feliz.” Mas eu respondi-lhe: “ Vai-te; eu
não te chamei; não preciso da tua amizade…” Era de tarde; a noite começava a
estender o negrume do seu véu sobre a natureza. Uma bela mulher, que eu mal
distinguia, estendia igualmente em meu redor a sua influência encantatória, e
olhava-me compassiva; porém, não ousava falar-me. Eu disse: “Aproxima-te de
mim, para que distinga com nitidez os traços do teu rosto, porque a luz das
estrelas não basta para os iluminar a esta distância.” Então, com passos
modestos e de olhos baixos, ela pisou a relva do chão dirigindo-se para o meu
lado. Disse-lhe logo que a vi “Vejo que a bondade e a justiça fizeram morada no
teu coração: não poderíamos viver juntos. Agora admiras a minha beleza, que já
transtornou a muitas; mas, mais tarde ou mais cedo, havias de arrepender-te de
me teres consagrado o teu amor; porque não conheces a minha alma. Não que te
seja alguma vez infiel: àquela que a mim se entrega com tanto abandono e
confiança, com tanta confiança e abandono, a ela me entrego; mas convence-te
disto, e nunca mais o esqueças: os lobos e os cordeiros não se olham com doces
olhos.”
(canto II,
excerto)
isidore
ducasse
conde de
lautréamont
cantos de
maldoror
trad. pedro tamen
fenda
1988
1 comentário:
Tão difícil é tornar esse o "encontro"!
Abraços do Pedra do Sertão
Venha nos visitar tb.
www.pedradosertao.blogspot.com.br
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