19 março 2011

william carlos williams / estas



--------ESTAS

são as semanas desoladas, sombrias
em que na sua aridez a natureza
rivaliza com a estupidez humana.

O ano despenha-se na noite
e o coração é um abismo
mais fundo que a noite

nesse vazio varrido pelo vento
sem sol, sem lua nem estrelas
apenas uma estranha luz do pensamento

que lança um tenebroso fogo -
rodando sobre si mesma até
no frio incendiar-se

e revelar ao homem algo que ele
desconhece, não a solidão
em si - não um espectro

ainda que o pudesse abraçar - vazio,
desespero - (gemendo
soluçando) entre

as chamas e os estrondos da guerra;
casas em cujos aposentos
o frio ultrapassa o imaginável,

aqueles que se foram e que amávamos
vazias as camas, húmidos os
sofás, as cadeiras sem uso -

Oculta-os algures
longe do pensamento, deixa-os criar
raízes e crescer, salvo de olhos e ouvidos

ciosos - por si somente.
A esta mina chegam para escavar - todos.
Será isto o contraponto da música mais

suave? A fonte da poesia que
ao ver o relógio parado, diz:
Parou o relógio

que ontem trabalhava tão bem?
e ouve o som das águas do lago
salpicando - agora petrificadas.







william carlos williams
antologia breve
tradução josé agostinho baptista
assírio & alvim
1993

fotografia urs stooss





1 comentário:

fernando machado silva disse...

é realmente um grande poeta. e o seu livro "paterson" é fenomenal!

abraços