com barcos na margem.
Estar junto da água e ver correr
voluptuosas nuvens na sua ampla corrente.
Arranjar um sítio aí, entre as ervas
azuladas, um vão donde ver
como é coisa pouca a nossa vida
e não ser vistos. E olhar os barcos
esticando e distendendo
uma corda de esparto no verde
caudal, com a água da chuva
apodrecendo nas suas tábuas. Esperar
a tormenta e contemplar o céu
vagabundo e anil. Ouvir o ruído
de gotas no rio, seus castelos
como tímbalos delicados.
E pensar, se se puder,
em quem amamos muito
ou se então não amamos, não pensar,
não pensar, não pensar.
E voltar os nossos olhos
para esse mudo decurso, e vazios
ficar sem que saibamos
quanto tem de sonho
o frio e a dor
e esses barcos sem gente
uns nos outros batendo
ou se poderemos despertar um dia.
poesia espanhola de agora vol. I
trad. joaquim manuel magalhães
relógio d´água
1997