Mostrar mensagens com a etiqueta vicente aleixandre. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta vicente aleixandre. Mostrar todas as mensagens

08 outubro 2023

vicente aleixandre / vida





 
Um pássaro de papel no peito
diz que o tempo dos beijos não chegou;
viver, viver, o sol invisível crepita,
beijos ou pássaros, tarde ou cedo ou nunca.
Para morrer basta um pequeno ruído,
o de outro coração ao calar-se,
ou esse regaço alheio que na terra
é um barco dourado para os cabelos louros.
Cabeça dolorida, têmporas de ouro, sol que declina;
aqui na sombra sonho com um rio,
juncos de verde sangue que neste instante nasce,
sonho apoiado em ti, calor ou vida.
 
 
 
vicente aleixandre
la destrucción o el amor (1932-1933)
antologia de vicente aleixandre
tradução de josé bento
editorial inova
1977



 

20 fevereiro 2016

vicente aleixandre / tens nome



Teu nome,
pois tens nome. A minha vida inteira foi isso:
um nome. Porque o sei não existo.
Um nome respirado não é um beijo.
Um nome perseguido sobre uns lábios
não é o mundo, mas o seu sonho às cegas.
Assim sob a terra, respirei a terra.
Sobre o teu corpo respirei a luz.
Dentro de ti nasci: morri por isso.


vicente aleixandre
antologia de vicente aleixandre
poemas de la consumación
tradução de josé bento
editorial inova
1977



06 maio 2014

vicente aleixandre / o moribundo


I

Palavras

Ele dizia palavras.
Quero dizer palavras, ainda palavras.
Esperança. O Amor. A Tristeza. Os Olhos.
E d´zia palavras,
enquanto a sua mão levemente débil sobre o lenço
                                                       [ainda vivia.
Palavras que foram alegres, foram tristes, foram
                                                           [elevadas.
Falava movendo os lábios, queria dizer aquele sinal;
o esquecido, esse que sabem dizer melhor dois
                                                                [lábios,
não, duas bocas que unidas em solidão pronunciam.
Mal dizia um sinal leve como um suspiro, dizia um
                                                             [respirar,
uma bolha; dizia um gemido e os lábios emudeciam,
enquanto as letras tingidas de um carmim em sua boca
muito débeis cintilavam, até cessar por fim.

Então alguém, não sei, alguém não humano,
alguém pôs uns lábios sobre os seus.
E ergueu uma boca onde ficou só o calor comunicado,
as letras tristes de um beijo nunca dito.




vicente aleixandre
antologia de vicente aleixandre
nascimento último (1927-1952)
tradução de José bento
editorial inova
1977



01 agosto 2013

vicente aleixandre / pensamentos finais



Nasceu e não soube. Respondeu e não falou

As almas surpreendidas olham-te
quando não passas. O vento não cumpre nunca.
Teu pensamento a sós cai lentamente.
Como as fenecidas folhas caem e voltam
a cair, se o vento as dispersar.
Enquanto as espera a sóbria terra,
aberta. Calado o coração, mudos os olhos,
teu pensamento desfaz-se vagaroso
no ar. Movido suavemente. Um som de ramos
finais, um esvaído sonho de ouros vivos
se esparge…  as folhas vão caindo.



vicente aleixandre
poemas de la consumación
antologia de vicente aleixandre
trad. josé bento
editorial inova
1977