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13 agosto 2024

tiago araújo / as planícies extrovertidas

 



 

 
esta rua é o começo do mundo (todos os
lugares são o início do infinito que se estende em volta).
abrimos o universo fechado do corpo
em planícies extrovertidas
de onde se prolongam os caminhos
que nos levam aos móveis, à tinta branca das paredes,
à linha divisória entre a escuridão e a luz do sol
de alcântara, à rua onde passam os eléctricos,
e à última paragem, de onde tudo se estende de
forma concêntrica, como de todos os lugares,
os órgãos realizam a fotossíntese com a luz indirecta do rio
e chove sobre a pele
 
 
 
tiago araújo
fórmulas
quasi
2004



11 maio 2013

tiago araújo / sábado


  
a manhã ainda pode ser salva se o tempo
mudar ou o café forte quebrar o vidro entre o som
e o sentido destas frases que recito em jejum
de um jornal atrasado. dormi mais do que o habitual,
entre papéis e o som distante do telefone,
um despertador absorvido pelo sonho. ao acordar não
consegui ler nas folhas do chá de ontem, despejado frio
pela banca da cozinha, o que farei com os restos de liberdade
que me sobraram do dia anterior.

na infância ensinaram-me como é perigoso
acordar um sonâmbulo, lição que tenho
aplicado de forma exemplar em relação a mim próprio.
o equilíbrio entre os dias e as noites foi-se alterando
de modo progressivo. ouço ao longe,
pela janela aberta, os sons do
carnaval de notting hill, um sinal de que o
verão terminou. queimo os cravos da mão esquerda, a mão
cega que não tem recebido todo o prazer ou o
reconhecimento que merece. chove.

e é tudo, descrição sem análise, na luz filtrada
de um dia em que se morre mais lentamente que nos anteriores.
daqui a pouco sairemos para as ruas de comércio, cais
onde se vão saudar paquetes
que já partiram, nas tardes de sábado, para nos perdermos
entre o ruído e o excesso de informação que
caracterizam o século vinte e um, sem
que ninguém repare que saí à rua sem o desejo vestido.

a cidade deixou de ser um mapa e, passado um ano, leio o nome
                                                                              das ruas
como quem incendeia os barcos à chegada a terra
para não ter forma de regressar a casa.



tiago araújo
resumo
a poesia em 2011
assírio & alvim
2012


02 março 2012

tiago araújo / o lugar do morto

  




ao teu lado, no lugar do morto, enquanto
conduzes a conversa a uma frase sem
preparação. chegámos tarde à praia,
como a quase tudo. o vento levanta o
pó do parque de estacionamento e não
saímos do carro. não sei a resposta certa
e por isso represento mal o meu papel secundário.
limito-me a ficar em silêncio, onde
sempre me senti mais confortável.
um lugar sombrio, discreto, abrigado
e ainda assim, segundo dizem, o mais perigoso.




tiago araújo
resumo
a poesia em 2009
assírio & alvim
2010