Mostrar mensagens com a etiqueta ron padgett. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta ron padgett. Mostrar todas as mensagens

12 janeiro 2021

ron padgett / poema de amor

 
 
 
Temos bastantes fósforos em casa.
Deixamo-los sempre à mão.
De momento a nossa marca favorita é Ohio Blue Tip,
antigamente preferíamos a marca Diamond.
Isto foi antes de descobrirmos os fósforos Ohio Blue Tip.
Estão maravilhosamente embalados em caixinhas resistentes
com etiquetas azul-claras, azul-escuras e brancas,
e as palavras dispostas em forma de megafone,
como se anunciassem ao mundo, ainda mais alto:
«Aqui está o fósforo mais lindo do mundo,
são três-centímetros-e-meio de pinho macio,
encapuçado por uma granulosa cabeça roxa sóbria e furiosa,
teimosamente pronta a rebentar numa chama,
acendendo, talvez, o cigarro da mulher que amas,
pela primeira vez, e nada voltou a ser o mesmo
depois disso. Tudo isto lhe oferecemos.»
é isto que me deste, eu
tornei-me o cigarro e tu o fósforo, ou eu
o fósforo e o tu o cigarro, ardendo
em beijos que se esvanecem direito aos céus.
 
 
 
ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018

 



05 outubro 2020

ron padgett / palavras da frente

 
 
Não parecemos tão jovens
quanto parecíamos
excepto a meia-luz
especialmente no
calor suave da luz das velas
quando dizemos
com toda a sinceridade
És tão gira
e
És o meu giraço.
Imagina
duas pessoas idosas
a comportarem-se assim.
É suficiente
para te fazer feliz.
 
 
 
 
ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018




 

27 fevereiro 2020

ron padgett / lá em baixo



As pessoas costumam repetir o velho conselho
«Vive todos os dias
como se fosse o último dia da tua vida».
O último dia da minha vida? O quê?
Ficaria frenético, a pular
como um canguru
com luvas de boxe
a socar o ar,
a tentar lutar contra o que quer que viesse.
O que as pessoas querem dizer é
«Estar plenamente comprometido com a vida».
Como um canguru sem luvas de boxe.


ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018






20 maio 2019

ron padgett / por um momento




É engraçado como
se te desprenderes
das coisas

elas voltam
a ti. Ou seja,
às vezes. Então

para que serve
esta generalização?
Ah, faz-te

sentir bem dizer
coisas destas
de tempos a tempos,

como se de facto
e realmente e verdadeiramente
soubesses alguma coisa!


ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018






12 novembro 2018

ron padgett / o poeta enquanto pássaro imortal




Um segundo atrás o meu coração deixou de bater
e eu pensei: «Seria uma péssima altura
para ter um ataque cardíaco e morrer,
a meio de um poemas», então reconfortou-me
a ideia de que nunca soube de ninguém
que morresse a meio da escrita de um poema,
assim como os pássaros nunca morrem a meio do voo.
Acho.



ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018









15 outubro 2018

ron padgett / paul eluard




Paul Eluard disse:
«Há outro mundo
mas está dentro deste»
ou algo semelhante.
Eu diria:
«Tudo é suficientemente estranho
tal como é»
ou algo semelhante.
A minha escrita à mão, por exemplo,
e a minha mão a escrever.
Mão, diz olá ao Paul Eluard.



ron padgett
poemas escolhidos
trad. rosalina marshall
assírio & alvim
2018