enquanto a música ardia num candeeiro
e a paisagem tomava uma paixão Tristão e Isolda
o teu corpo ajustava-se ao meu
como a mão se ajusta ao que quer esconder.
escorchada
mostravas-me os teus tendões de madeira
e os pequenos ramos de luxúria
que podiam tecer-se com as tuas veias
nos nossos peitos trémulos como folhas de jardim
ouvia-se um galope de bisontes no cio
todas as falas de amor se assemelham
todas têm acordes delirantes
e o peito esmagado
por músicas de séculos de memórias.
vêm depois o coração e o vento
o vento dobador de sons em pontas
doces como sangue
de uivos feitos carne
que ímpetos que esperas de mares rasgados
convertidos em níquel
ou em canto ecuménico daquilo que podia ter disso
tragédia
nascerão juntos os pássaros das nossas bocas
enquanto a morte nos penetra pelos pés?
tensa como uma ponte de beijos de pedra soou
a uma
as duas voaram de mãos cruzadas
as três ouviam-se mais distantes que a morte
as quatro já tremiam de auroras
as cinco desenhavam a compasso o grande circuito
transmissor do dia
às seis ouviram-se as cabrinhas dos alpes
levadas por monges ao altar
luis buñuel
poemas
trad. de mário cesariny
arcadia
1977
