ruinas
príncipe muerto
um canto com uma máquina
de tabaco – . Não. Então era diferente, havia
uma
mesa com um candeeiro; e não existia essa janela.
Não era bonito. Mas
tinha um não sei quê, e comigo sempre
foi tão generoso… – O velho levantou os olhos
(como água suja), – Não se importa
– disse – que peça outro café?
Sim – disse depois de uma pausa – , não era bonito.
Às vezes íamos, aí, perto,
a uma casa que alugava quartos.
Ainda me lembro dos seus beijos.
devastado pelos anos. O coto de uma alma
que tinha unido a sorte da sua carne
ao obscuro prazer de Alexandria.
O olhar já morto, os lábios
– lábios aquela greta arroxeada? – secos,
as mãos como garras e a pele com o brilho
dessas lapelas dos fatos muitos gastos
mil vezes passadas a ferro.
Tentei imaginar
como seria esse corpo quando atraiu Kavafis.
Como foi, jovem, aquele rosto. Que graça irradiou um dia.
A seda adolescente, a embriaguez do cheiro jovem,
os anéis de cabelo negro sobre a testa. Como
foram aqueles lábios
quando o amor os humedecia, com que fogo queimavam
aqueles olhos, já apagados.
a imagem que viu Kavafis quando sonhou com Mebes?
A sedução do jovem empregado numa loja?
Aquele despojo
de cinemas, urinóis de estação, de ruelas portuárias
era o rosto divino de Tamides
ou o jovem de Antioquia tão amado por Balas?
que me deixasse averiguar a sua juventude.
de notável formusura. Os olhos daquele velho
brilharam de desejo. E então dei-me conta
de que sim, bem pôde ser ele
o modelo de Miris ou o jovem do espelho,
pois que se tudo já tinha morrido
naquele corpo – memória, orgulho, dignidade –
as brasas do amor continuavam a arder
e o mais ligeiro sopro tornava-as incandescentes,
e aqueles olhos, ainda que por um instante,
de novo eram belíssimos, e esses lábios
outra vez húmidos de amor, e aquelas mãos
outras vez se dispunham a servir o Desejo.
poesia espanhola de agora vol. I
trad. joaquim manuel magalhães
relógio d´água
1997