Entre as imagens do céu, as de maior beatitude e
profundeza, são as que se proíbem à criança: a descida da noite ou a iluminação
atroante do dia.
Desdobra-se a luz finíssima e as nuvens apagadas
dão um novo rosto aos céus. O que se perdeu daquele tecto de estrelas é o
calcanhar vagaroso e encoberto que passeia. Disse-me, é a Lua. A criança estava
deitada a vê-la mover-se depressa, e a mostrar aquele aspecto de cavalo manso à
bicharada da neblina. E vê um louco a atar o cabelo de um gigante na crina, o
homem a acordar arrastado pela convulsão do vento e a fragilidade de uma
figura, anão talvez, que se sente perseguido. Outros embatem nesse corpo
impetuoso de Deus. Um olho único, luzidio, indescritível, empalidece com a
monstruosidade do Príncipe das Trevas.
Abre-se o azul naquele espaço vasto e algo soberano
faz girar o cone de um Universo que assustava a criança. Na verdade, a dimensão
do céu é a alma da criança.
josé emílio-nelson
hífen 6 fevereiro, 1991
cadernos semestrais de poesia
heresias
1991