Mostrar mensagens com a etiqueta dick davis. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta dick davis. Mostrar todas as mensagens

27 maio 2022

dick davis / ibn battuta

 
 
Perto do princípio da sua primeira viagem
O grande viajante (que havia de sofrer
Naufrágio, a perda de todos os bens, dos escravos
– De quem tanto gostava – e do filho; que havia
De enfrentar piratas, salteadores, ser gasalhado
Por príncipes como um igual e ser alvo de escárnio
Como um pedinte; que havia de ver o conhecido
Mundo e suas maravilhas) perto do princípio
Da sua primeira viagem diz-nos ele como,
Companheiro duma caravana de viandantes,
Chegou a uma cidade e como a multidão
De gentes amigas e de parentes saiu dela
A dar-lhes as boas vindas, cada homem saudado
Por um rosto que conhecia, à excepção dele,
Ibn Battuta, a ele ninguém o saudava
Visto que lá ele era um estrangeiro, e como
Chorou.
           Quando se fecha o livro este retrato
De um homem com cerca de vinte anos a chorar
– E não os príncipes, os escravos e os naufrágios –
É o que fica comigo
                            quase que sentes
Através dos séculos a compressão dos
Teus dedos de encontro ao seu braço e escutas
A tua voz erguer-se para saudá-lo.
 
 
 
dick davis
trinta e dois poemas
trad. joaquim manuel magalhães
as escadas não têm degraus – 2
livros cotovia
1990




07 março 2022

dick davis / o mensageiro

 
 
Foi há anos que estiveste
Insistente à minha porta,
Falavas com olhos mudos
Dessa calma e muda costa –
 
Foi há anos, eu ergui-me,
Ao teu apelo entreguei-me,
Com as mãos te saudei
Alheio ao vulto do muro
 
Entre os mortos e os vivos –
Qual se também ir pudesse
Onde o escuro compusesse
O pesar intolerável.
 
E agora que neste ocaso
Regressaste, levantado
Leio de novo o silêncio
Dum escuro olhar lembrado.
 
 
 
dick davis
trinta e dois poemas
trad. joaquim manuel magalhães
as escadas não têm degraus – 2
livros cotovia
1990




11 novembro 2015

dick davis / subida



Entra na claridade que tu amas –
O ar ténue das alturas sobre as nuvens
Que dispersam ao vento do inverno,
Assim dealba um entendimento, se extingue
Uma ilusão amada
                                para que vejas
O mundo com olhos desimpedidos.

Aqui, no cimo, a teus pés,
Estende-se o lago que foi vulcão,
O sombrio Avernus do eu.


dick davis
trinta e dois poemas
trad. joaquim manuel magalhães
as escadas não têm degraus – 2
livros cotovia
1990