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19 fevereiro 2025

alain morin / 13 de junho…

 
 
 
     Procuro como um requinte o ângulo na beleza. Que nenhum dos livros empilhados saia da esquadria. Concebo assim uma arquitectura sensorial para o que tenta ser torre no acanhado espaço onde resido. Uma pilha de livros é um templo onde venero um deus indelével, informulado, hermeticamente fechado. Abrir um deles constitui um esforço sagrado que pode afectar todo o edifício. Às vezes, deslocando cuidadosamente os livros através da pilha, procuro casar determinado título com outro, para ver que consequências essa união mágica produz. Outras, é da colisão entre dois autores que, através da fermentação da sombra, espero conseguir um álcool celeste.
 
 
alain morin
trad. luís miguel nava
hífen 5 março
cadernos semestrais de poesia
tradução
1990
 




16 dezembro 2019

alain morin / 5 de julho…




     Estou a lavar a louça. Arranco um último grito aos pratos afogando-os na espuma. As facas serrilhadas que vou buscar às profundezas da tina todas sujas de queijo ou de manteiga, hei-de esfregá-las até não restarem os mais ínfimos vestígios, para que subsista apenas o futuro da mesa posta, onde elas e os garfos estarão, como uma mecânica de luto, de cada um dos lados do disco gelado onde assenta o miserável coração do mundo. São elas o presente do metal – bem como eventualmente o seu futuro – e a sua dinâmica no estreito espaço onde serão utilizadas determinará a abstracção da refeição.



alain morin
trad. luís miguel nava
hífen 5 março
cadernos semestrais de poesia
tradução
1990