à Manuela Pilar
O raio fulminou-me os berlindes
agora invejo os olhos dos
mortos
espreitando no telhado da missa
o caminho que seguem os porcos
Risco no céu com uma vara
nomes iguais a qualquer cão
Para a verdura dos séculos fica
uma mensagem de indignação
Os vivos têm berlindes
mas não os querem usar
Bolsos cheios
fatos de cerimónia pretos
nos seios rectos da criada de mamar
Na virgindade de que são feitas as gerações
a par das locomotivas quero
quebrar meus nervos na ânsia que me faz correr
vinagre nas feridas
Hei-de criar uma nova forma de cansaço
gemer a sorrir de medo
no arame que assobia
dançando larguras no espaço
Sabe bem ouvir o silêncio
e a morrer nele a cada instante
ficar na argola de guardanapo
guardado inconstante
Se quisesse que a alegria me desse
um modo simples de ser
não te ouviria no pêndulo que vem
às duas três horas bater
O pêndulo que acelera
vai e traz a tua voz
e morder me desespera
morder a imagem de nós
E acredito que amanhã
torne a ouvir mesmo os ruídos
entalado pelo sol pela noite
com casacos de ratos aos gritos
fernando lemos
teclado universal
cadernos de poesia
campo das letras
2004
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