XXXII Fechei os olhos, para ver melhor tudo o que a luz me negava! – E quando o sono chegou antes da revelação, senti a minha alma paralela como as grades que um jardim desenha, às vezes, no chão… maria alberta menéres intervalo 1952 poesia completa porto editora 2020
1. No quebrar de cada onda, vive uma canção falhada! – Mas não importa cantar. Basta uma onda incompleta para dar sentido ao mar… 2. O silêncio dorme, estendido na areia. Velam três rochedos, todos três calados, todos três olhando sem compreender! – Ai se Deus me desse esta ignorância calma, feita de me cumprir, sem o saber… maria alberta menéres intervalo 1952 poesia completa porto editora 2020
Somos um areal imenso e uma gota de orvalho no mar Uma terra gretada e insubmissa onde os cardos florescem E uma triste, suavíssima razão de névoa ou de soluço. Perdemos o presente cada dia povoando outros dias. Que o futuro deslumbra! É um povo sem fim e uma triste, suavíssima razão de pele e de penumbra. maria alberta menéres o robot sensível, 1961 poesia completa porto editora 2020
XXI Adora a flor das árvores, adora toda a vaidade que das coisas vem. Por ela nos traímos e vencemos, e em cada hora de traição esquecemos a dor de fruto que essa flor contém. maria alberta menéres cântico de barro 1954 poesia completa porto editora 2020
Hoje a tristeza é outra e dela falo com a minha língua de ar. Em tudo existe uma polida lágrima embrulhada em papel deslumbrado de outras mágoas. Algo me diz que nada se transmite da paixão à mais lenta compaixão, dos dedos aos enredosda
prudência à tão pura imprudência passeando no peito que um feroz acolhimento para ela em seus ócios inventou. Porque a tristeza é outra e dela falo hoje por ser diferente e triste ser. maria alberta menéres o jogo dos silêncios 1996 poesia completa porto editora 2020
Aqui posso medir tudo o que digo pelo eco em montanhas indomáveis: toco a crosta da terra e de repente logo um som me anuncia em claridade. Ouvir fica para lá de qualquer voz junto à fonte mais triste onde se guarde uma pequena lágrima que esqueça o que de mim se lembra em tenra idade maria alberta menéres o jogo dos silêncios poesia completa porto editora 2020
XLIII Quando o sol não vier nesse dia diferente do que sei, quando tudo o que traz a madrugada for tão sincero e extenso como esta areia fria, farei então, da bruma e do silêncio, todas as mãos que me faltam, e nelas repousarei! maria alberta menéres meditação poesia completa porto editora 2020