11 março 2025

gonçalo m. tavares / o sol

 
 
 
Na infância o sol era um companheiro mais alto,
Que aparecera primeiro no campo de futebol, e aí, parado,
Guardava as costas da baliza e a erva que se tornava quente.
Como se o sol fosse de facto um instrumento de cozinha,
Aperfeiçoado, antigo, mas instrumento, matéria
Que os meninos agarravam com os dedos e cuja
Intensidade podiam por vontade própria regular.
Por exemplo: quando a luz era excessiva
Os dedos protegiam os olhos. Outras vezes
O corpo parecia a conclusão
Natural, instintiva, do calor que vinha de cima:
Recebíamos o sol como o ponto final recebe
Uma frase. Fazia mais sol quendo eu tinha seis anos
(quem o fazia?) ou com o tempo e o tédio
Me fui distraindo?
 
 
 
gonçalo m. tavares
1 poesia
relógio d´água
2004




 

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