14 fevereiro 2025

carlos saraiva pinto / farás do sono o abrigo

 
 
 
farás do sono o abrigo
dos anjos lentos.
 
a visão melancólica
dos rios obstinados.
 
ao menos uma vez
 
como a dimensão
dos pequenos passos
a caminho das mãos dissolvidas.
 
o rosto é meigo.
 
o lugar diante dos peixes
espalhará a neblina
tocada em mel a indiferença
que povoou de ausência
as libélulas interiores.
 
ó saliva inconsolável dos deuses.
no lado esquerdo do peito
o musgo dispersivo cobre o tempo
subtis pormenores
de gestos que escapam.
 
a minha memória parou.
o sofrimento vigia os mares
e na película dos amieiros
a noite cai árida e grave.
 
só o viajante da noite
contempla o mármore da face.
ouve a densa página das dunas,
 
os órfãos iluminados da chuva,
nas pegadas solitárias do outono
sobre os abismos do oeste.
 
descerás assim despido de luz
à verdura da terra
 
e a extensa morte
cobrirá de lama e sulcos
o teu reino.
 
 
 
carlos saraiva pinto
escrever foi um engano
o correio dos navios
2001
 




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