Não passe este
prospecto sem o ter lido todo.
Não passe uma
porta se encontrar alguém que chora do outro lado.
Observe bem antes
que o acusem de homicídio,
que uma sombra
urgente o abrace com mágoa, o
confunda com
outro,
lhe faça sinais e
convide para a cama…
Portanto, leia em
pormenor o papel; depois vêm-nos
reclamar e não
estamos, compreenderá, para isso.
Se lhe surgir
qualquer dúvida,
se lhe vier de
repente um sorriso aos lábios ou pensar que lhe
mentem,
rasgue o papel em
mil pedaços, não se preocupe, há perdão
para o furtivo,
não constará no
expediente, continue.
Momentos há em que
rasgados os papéis mais fácil é,
mais bela é a
leitura:
reconhece-se antes
a palavra seguinte,
pronuncia-se com
facilidade o verso e deixam de notar-se
as lentas torções
do decassílabo.
Ao fundo, na
expressão:
não se esqueça de
apagar o cigarro, abrir a alma,
murmurar à sua
sombra algum silêncio:
apagar a luz,
sentir entre os lençóis
o livro a
fechar-se, ouvir as boas noites.
jesus urceloy
poesia espanhola anos
90
trad. joaquim manuel magalhães
relógio d´água
2000