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24 março 2013

albano martins / uma folha, o seu galope




O que persegues é apenas
uma folha, o seu galope, a crina
verde de um retrato
saído da moldura.
                             Quantas
palavras te são
ainda necessárias
para dizer a calcinada
lâmina do sangue, a exígua
metáfora
do corpo abandonado
à sua cremação?



albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999



12 janeiro 2013

albano martins / acontecimento




Tu choravas e eu ia apagando
com os meus beijos os rastos das tuas lágrimas
─  riscos na areia mole e quente do teu rosto.
Choravas como quem se procura.
E eu descobria mundos, inventava nomes,
enquanto ia espremendo com as mãos
o meu sangue todo no teu sangue.

Não sei se o mundo existia e nós existíamos realmente.
Sei que tudo estava suspenso,
esperando não sei que grave acontecimento,
e que milhares de insectos paravam e zumbiam nos
meus sentidos.
Só a minha boca era uma abelha inquieta
percorrendo e picando o teu corpo de beijos.

Depois só dei pela manhã,
a manhã atrevida
entrando devagar, muito devagar e acordando-me.
Desviei os meus olhos para ti :
ao longo do teu corpo morriam as estrelas.
A noite partira. E, lentamente,
o sol rompeu no céu da tua boca.




albano martins
assim são as algas
campo das letras
2000



04 outubro 2012

albano martins / visitação


  
Quando a porta se abriu,
perguntaste quem era.

Não se pergunta ao amor
que nome tem.



albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999




17 julho 2012

albano martins / porque são numerosos





Não te esqueças de,
ao sair,
deixar a porta
aberta. Podes
perder a chave
e não entrar.
Ou podem roubar-ta,
o que é pior.
Porque são numerosos
os ladrões do azul.




albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999



16 janeiro 2012

albano martins / o nome da ausência




O sótão: era ali
que o mundo começava. Ainda
não sabias, então,
quantas letras te seriam
necessárias para soletrar
o alfabeto dos dias, para encher
a tua caixa
de música, a tua concha
de areia. E ainda
o não sabes hoje. Com cinza
nada se escreve a não ser
as vogais do silêncio. E este
é o nome que se dá à ausência,
quando a noite e a poeira
dos astros pousam
sobre a ranhura dos olhos.





albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999




06 dezembro 2009

albano martins / não são apenas os relógios







Também se pode
regressar sem partir. Não são apenas
os relógios que se atrasam, às vezes
é o próprio tempo. E todos
os cuidados são
então necessários. Há sempre
um comboio que rola
a nosso lado sem luzes
e sem freios. E pode
faltar-nos o estribo ou já
não haver lugar
na carruagem da frente.






albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999