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24 setembro 2024

paul celan / cristal

 



 

 
Não busques nos meus lábios a tua boca,
nem diante do portão o forasteiro,
nem no olho a lágrima.
 
Sete noites mais alto muda o vermelho para vermelho,
sete corações mais fundo bate a mão à porta,
sete rosas mais tarde rumoreja a fonte.
 
 
 
paul celan
sete rosas mais tarde
antologia poética
trad. João barrento e y. k. Centeno
relógio d´água
2023








14 janeiro 2024

paul celan / tübingen, janeiro

 
 
Olhos con-
vertidos à cegueira.
A sua - «um
enigma é puro
brotar» –, a sua
memória de
torres de Hölderlin à tona de água, no esvoaçar
de gaivotas.
 
Visitas de marceneiros afogados com
estas
palavras a afundarem-se:
 
Se viesse
se viesse um homem,
se viesse um homem ao mundo, hoje, com
a barba de luz dos
patriarcas: só poderia,
se falasse deste
tempo, só
poderia
balbuciar balbuciar
sempre, sempre,
só só.
 
 
 
paul celan
trad. joão barrento
as escadas não têm degraus 3
livros cotovia
março 1990




10 agosto 2023

paul celan / no poço do tempo

 
 
NO POÇO DO TEMPO,
decifrando o mundo:
 
a gaivota entra e fica,
a greda ganha forma,
 
do gelo em frente
acena aquele que é para mim
e para o mundo o mais perigoso
dos nomes.
 
 
 
paul celan
a morte é uma flor
trad. de joão barrento
relógio d´água
2022




08 fevereiro 2023

paul celan / oiço tanta coisa de vós

 




 
OIÇO TANTA COISA DE VÓS
que não oiço mais
do que ouvir,
 
vejo tanta coisa de vós
que não vejo mais
do que ver,
 
tanta coisa me assedia
com desconversa
que dou por mim a falar
como quem conversa,
que dou por mim
a falar como quem
fica em silêncio.
 
Eu vivo, forte.
 
 
 
paul celan
a morte é uma flor
trad. de joão barrento
relógio d´água
2022




23 fevereiro 2021

paul celan / nas estrias

 
 
NAS ESTRIAS
de moeda celeste pela fenda da porta,
forças tu a palavra
fora da qual rolei,
quando meus punhos trémulos
o tecto sobre nós
quebravam – ardósia por ardósia,
sílaba a sílaba – pelo amor
de um brilho
cobre, no prato do mendigo,
la em cima.
 
 
 
 
paul celan
trad. antónio magalhães
hífen 5 março
cadernos semestrais de poesia
tradução
1990






21 maio 2014

paul celan / com brancusi, a dois



Se destas pedras uma
anunciasse
o que a faz silêncio:
aqui, muito perto,
na bengala deste velho,
isso se abriria, como uma ferida
em que terias que mergulhar,
solitário,
longe do meu grito, ele também já
talhado pelo cinzel, branco.


paul celan
trad. joão barrento
as escadas não têm degraus 3
livros cotovia
março 1990