11 junho 2024

vasco graça moura / picasso visto do porto

 
 
1
 
musa, quando você se despe no meu quarto
e à meia-luz o seu olhar faísca atrás de um ombro
e muito de costas nuas o cigarro vicioso desponta a um canto da pintura
                                                                                          [agressiva
e as suas pernas se arqueiam antecipando a música,
 
o movimento do colar faz-me lembrar Baudelaire
mas você cita t. s. eliot e outros cerebrais
e a sua roupa esvoaça em mariposas lânguidas
e ritmos a camisas despregadas
 
e você, rapsoda, ainda há pouco
semitaconeando insinuava projectos
do alto desses saltos que transmitem
esguia vibração aos seus artelhos.
 
partilharei consigo ocupações pontuais,
tenho agora de escrever sobre picasso
visto do porto, encomenda tão óbvia
que até se corre o risco de cair no melancólico.
 
 
 
vasco graça moura
os rostos comunicantes
poesia 1963/1995
quetzal editores
2007
 



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