08 abril 2024

maria gabriela llansol / inquérito às quatro confidências

 



 

24 de Novembro de 1994
 
Foi a minha vez de fazer anos Tenho, de novo. Necessidade de me pôr em movimento, talvez mudar fisicamente de lugar, desfazer-me de móveis, de objectos, de roupas – aligeirar o sólido em proveito dos sinais e das imagens que o texto me trouxer. Afinal, o único lugar do corpo que verdadeiramente se move. Quando eu nasci, tudo estava relacionado com o espaço e o tempo.
A meio da vida, Vergílio falava do equilíbrio interior que exigia o absoluto do eu e a pergunta que continua sem resposta____saber se havia uma ponte do tempo sobre o espaço.
– Gabriela estará alguém à minha espera?
Não sei
«Se a pergunta é de saber», é o que hoje me respondo. – Vou nessa ponte sobre um burro carregado, o horizonte é vasto, o mar é interior e a vida, paradoxalmente, não sei se tem duração, ou não. Mas se a pergunta for de querer, de pujança então digo que paro o burro, deito os objectos às margens, ao fundo que os guarde, debruço-me na ponte, com o meu burro livre a meu lado,
Debruço-me sobre os meus membros e patas e vejo as imagens flutuando, a minha também, finalmente a desaguar no mar.
 
 
 
maria gabriela llansol
inquérito às quatro confidências
relógio d´água
1996
 


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