03 janeiro 2024

luís miguel nava / a roupa

 
 
Entre o meu corpo e a roupa que o reveste há uma distância enorme. Dir-se-ia que a roupa está nas insondáveis profundezas dum abismo em torno de cuja protecção os meus órgãos se expusessem aos caprichos do céu. Bloqueiam-me as vértebras palavras de cujo sentido o próprio sol precisa para brilhar. Sai-me do corpo o tempo num só vómito, o que torna transparente todos os meus órgãos. A roupa é uma incógnita, esmagada assim entre a esperança e as torrentes.
 
 
 
luís miguel nava
o céu sob as entranhas
poesia
assírio & alvim
2020
 



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