06 novembro 2022

ovídio / metamorfoses

 


 

“Se tu me conhecesses bem, arrependias-te de fugir de mim;
tu própria reprovarias as demoras e tudo farias para me reter.
Tenho grutas, parte de uma montanha, de tectos abobadados
na rocha viva, onde nem o sol no pino do Verão se sente,
nem se sente o Inverno. Tenho maçãs nos ramos carregados,
tenho, nas longas vides, cachos de uvas iguais ao ouro,
e tenho também purpúreas; umas e outras guardo para ti.
Com as tuas mãos, tu própria colherás deliciosos morangos
que brotam na sombra do bosque, colherás cornisos outonais
e ameixas, não só aquelas azuladas com o seu sumo escuro,
mas também aquelas, tão requintadas, que parecem cera fresca.
Se casares comigo, jamais te faltarão castanhas, jamais faltarão
os frutos do medronheiro; todas as árvores serão ao teu serviço.
Todos estes rebanhos são meus; muitos outros erram nos vales,
muitos no bosque se abrigam, muitos estão recolhidos nas grutas.
Não seria capaz de dizer quantos são, se acaso perguntasses.
Só pobres contabilizam os animais! No elogio que lhes faço,
não precisas de acreditar: vem aqui e tu própria poderás ver
como de tão inchados os úberes mal cabem entre as coxas.
E quanto a crias, possuo em tépidos redis cordeirinhos,
e possuo também, da mesma idade, cabritos noutros redis.
Nunca me falta o leite da cor da neve; parte dele guardo
para o beber, parte o coalho nele dissolvido endurece.
As prendas que te caberão não são encantos fáceis de obter,
nem demasiado banais, como gamos ou lebres ou um bode,
ou um casal de pombas ou um ninho roubado a uma copa.
Nos cimos da serra descobri, para poderem brincar contigo,
duas crias de felpuda ursa, de tal forma iguais entre si
que dificilmente conseguirás distinguir uma da outra.
Achei-as e disse: ‘estes vou guardar para a minha senhora’.
Agora, tira só a tua brilhante cabeça para fora do mar azul,
vem agora, Galateia, e não desdenhes os meus presentes!
 
 
 
ovídio
metamorfoses
livro XIII
tradução paulo farmhouse alberto
livros cotovia
2018

 




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