05 março 2021

joan margarit / não deites fora as cartas de amor

 
 
Elas não te abandonarão.
Passará o tempo, apagar-se-á o desejo
– essa flecha de sombra –
e os rostos sensuais, inteligentes, belíssimos
ocultar-se-ão em ti, no fundo de um espelho.
Cairão os anos. Cansar-te-ão os livros.
Decairás ainda mais
e perderás até a poesia.
O ruído frio da cidade nos vidros
acabará por ser a tua única música,
e as cartas de amor que tiveres guardado
serão a tua ultima literatura.
 
 
 
joan margarit
misteriosamente feliz
trad. miguel filipe mochila
flâneur / língua morta
2020




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