28 julho 2020

luís filipe parrado / teoria da narrativa familiar



Naquele tempo o meu pai trabalhava
por turnos
como herói socialista
no sector siderúrgico
e dormia com a minha mãe.
A minha mãe esfregava
a sarja encardida:
a água ficava da cor da ferrugem.
Havia, por perto, um cão
esgalgado,
sempre a rondar.
Depois, a minha irmã nasceu
e eu fui obrigado
a rever a minha mitologia privada do caos.
Entre uma coisa e outra
aprendi a mentir.
E isso, não sei se sabem, mudou tudo.


luís filipe parrado
entre a carne e o osso
língua morta
2019





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