16 dezembro 2019

alain morin / 5 de julho…




     Estou a lavar a louça. Arranco um último grito aos pratos afogando-os na espuma. As facas serrilhadas que vou buscar às profundezas da tina todas sujas de queijo ou de manteiga, hei-de esfregá-las até não restarem os mais ínfimos vestígios, para que subsista apenas o futuro da mesa posta, onde elas e os garfos estarão, como uma mecânica de luto, de cada um dos lados do disco gelado onde assenta o miserável coração do mundo. São elas o presente do metal – bem como eventualmente o seu futuro – e a sua dinâmica no estreito espaço onde serão utilizadas determinará a abstracção da refeição.



alain morin
trad. luís miguel nava
hífen 5 março
cadernos semestrais de poesia
tradução
1990





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