28 novembro 2018

charles bukowski / uma definição




o amor é uma luz
a correr de noite pelo nevoeiro

o amor é uma carica de cerveja
pisada a caminho
da casa de banho

o amor é a chave de casa perdida
quando estás bêbado

o amor é o que acontece
uma vez a cada dez anos

o amor é um gato esmagado

o amor é o velho ardina
na esquina
que já desistiu

o amor é o que tu pensas que a outra
pessoa destruiu

o amor é o que desapareceu
na época dos vasos de guerra

o amor é o telefone a tocar
a mesma voz ou outra voz
mas nunca a voz
certa

o amor é traição
o amor é a incineração
de vagabundos num beco

o amor é ferro
o amor é a barata
o amor é a caixa de correio

o amor é a chuva no telhado
de um velho hotel
em Los Angeles

o amor é o meu pai num caixão
(o teu pai que te odiava)

o amor é um cavalo com uma pata
partida
a tentar levantar-se
perante uma assistência
de 45 000 pessoas

o amor é o modo como fervemos
como a lagosta

o amor é tudo aquilo que dissemos
que não era

o amor é a pulga que não consegues
encontrar

e o amor é uma melga
o amor são 50 granadeiros

o amor é uma arrastadeira
vazia

o amor é um banco de bar vazio

o amor é um filme do desastre de Hindenburg
a encarquilhar aos pedaços
um momento que ainda grita

o amor é Dostoiévski diante
da roleta

o amor é o que rasteja
pelo chão

o amor é a tua mulher a dançar
nos braços de um estranho

o amor é uma velha
a roubar um pedaço de
pão

e o amor é uma palavra
usada demasiadas vezes e
demasiado
cedo.



charles bukowsky
os cães ladram facas
trad. rosalina marshall
alfaguara
2018








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