A minha juventude passou e eu não estava lá. 
Pensava em outra coisa, olhava noutra direcção. 
Os melhores anos da minha vida perdidos por distracção! 
Rosalinda, a das róseas coxas, onde está? 
Belinda, Brunilda, Cremilda, quem serão? 
Provavelmente professoras de Alemão 
em colégios fora do tempo e do espa- 
ço! Hoje, antigamente, ele tê-las-ia 
amado de um amor imprudente e impudente, 
como num sujo sonho adolescente 
de que alguém, no outro dia, acordaria. 
Pois tudo era memória, acontecia 
há muitos anos, e quem se lembrava 
era também memória que passava, 
um rosto que entre outros rostos se perdia. 
Agora, vista daqui, da recordação, 
a minha vida é uma multidão 
onde, não sei quem, em vão procuro 
o meu rosto, pétala dum ramo
húmido, escuro.
manuel antónio pina
um sítio onde pousar a cabeça
(1991) 
todas as palavras
poesia reunida
assírio & alvim
2012
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