28 fevereiro 2014

italo calvino / as cidades invisíveis

silvia como, via flickr
As cidades e os mortos. 4


O que torna Árgia diferente das outras cidades é que em vez de ar tem terra. As ruas estã completamente cobertas de terra, as salas cheias de argila até ao tecto, sobre as escadas assenta outra escada em negativo, por cima dos telhados das casas pairam camadas de terreno rochoso como céus com nuvens. Se os habitantes poderão andar pela cidade alargando os cunículos dos vermes e as fendas em que se insinuam as raízes, não o sabemos: a humidade quebra os corpos e deixa-lhes poucas forças; convém que fiquem quietos e deitados, de tão escura que é.
De Árgia, cá de cima, não se vê nada; há quem diga: «É lá em baixo» e só nos resta acreditar; os lugares são desertos. De noite, encostando o ouvido ao chão, às vezes ouve-se bater uma porta.



italo calvino
as cidades invisíveis
trad. josé colaço barreiros
teorema
1999


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