20 janeiro 2013

fernando alves dos santos / dois poemas da tranquilidade




I
Deve haver uma maneira tranquila
uma tranquilidade
uma certeza.
Deve haver uma febre
uma febre que seja, quando menos,
que nos dê olhos para ler tudo.
Depois dizem que há uma salvação...

Da minha infância
não guardo agora senão o chão que piso
e esse não chega.
Talvez a minha face
o meu vulto
a sombra
possam servir de algo.
Mas não.

Assim sem alegria
arrefecido, antigo
como posso comover-me
arder exausto
ou beijar o ar
o ar simplesmente
enleado!


II
Porque não posso senão trazer esta humildade
como posso dar-me ou pedir-me
se me pedem e me dão
dizendo fazê-lo por uma esperança.
Mas eu vejo
o que a morte me tem sido para que veja
e não respondo ao que imagino
porque sei que só posso desejar o que desejo.




fernando alves dos santos
a única real tradição viva
antologia da poesia surrealista portuguesa
perfecto e. cuadrado
assírio & alvim
1998



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