17 agosto 2010

luis filipe castro mendes / história pessoal

1.
Entre a morte e a música,
abandonámos finalmente as nossas mãos sobre as águas.
A persistência dos rios serviu-nos de guia
e o silêncio escondeu-nos
de olhares atravessados pelo frio
de uma só palavra.


2.
A recusa
percorrida na terra,
partilhada
por mãos brutais de amor,
a recusa
floresce,
transforma o pássaro na sua própria voz
transfigurada.


3.
A dor
«antiquíssima, libertando»
o archeiro do seu arco,
o tempo do seu peso,
tornando enfim o corpo
pura respiração.


4.
A poesia
recupera restos, tonalidades
desapercebidas,
a intensidade de uma paixão vazia.
A poesia
não tem memória.


5.
Margens
de orvalho
ou a inquietação penosa
de durarem os dias
na sua perda.


6.
A claridade
da flor na chama,
o rumor
por dentro dos frutos,
a palavra «raiz».

O inverno
nas árvores enfim concordes.


7.
O amor, uma história
quase pessoal.






luís filipe castro mendes
poemas
nova renascença
janeiro/março
inverno de 1987








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