Porque o melhor, enfim,
É não ouvir nem ver...
Passarem sobre mim
E nada me doer!
 
 – Sorrindo interiormente,
Co'as pálpebras cerradas,
Às águas da torrente
Já tão longe passadas. –
 
 Rixas, tumultos, lutas,
Não me fazerem dano...
Alheio às vãs labutas,
Às estações do ano.
 
 Passar o estio, o outono,
A poda, a cava, e a redra,
E eu dormindo um sono
Debaixo duma pedra.
 
 Melhor até se o acaso
O leito me reserva
No prado extenso e raso
Apenas sob a erva
 
 Que Abril copioso ensope...
E, esvelto, a intervalos
Fustigue-me o galope
De bandos de cavalos.
 
 Ou no serrano mato,
A brigas tão propício,
Onde o viver ingrato
Dispõe ao sacrifício
 
 Das vidas, mortes duras
Ruam pelas quebradas,
Com choques de armaduras
E tinidos de espadas...
 
 Ou sob o piso, até,
Infame e vil da rua,
Onde a torva ralé
Irrompe, tumultua,
 
 Se estorce, vocifera,
Selvagem nos conflitos,
Com ímpetos de fera
Nos olhos, saltos, gritos...
 
 Roubos, assassinatos!
Horas jamais tranquilas,
Em brutos pugilatos
Fraturam-se as maxilas...
 
 E eu sob a terra firme,
Compacta, recalcada,
Muito quietinho. A rir-me
De não me doer nada.
 
  
  
 camilo pessanha
clepsydra
assírio & alvim
2003
  
É não ouvir nem ver...
Passarem sobre mim
E nada me doer!
Co'as pálpebras cerradas,
Às águas da torrente
Já tão longe passadas. –
Não me fazerem dano...
Alheio às vãs labutas,
Às estações do ano.
A poda, a cava, e a redra,
E eu dormindo um sono
Debaixo duma pedra.
O leito me reserva
No prado extenso e raso
Apenas sob a erva
E, esvelto, a intervalos
Fustigue-me o galope
De bandos de cavalos.
A brigas tão propício,
Onde o viver ingrato
Dispõe ao sacrifício
Ruam pelas quebradas,
Com choques de armaduras
E tinidos de espadas...
Infame e vil da rua,
Onde a torva ralé
Irrompe, tumultua,
Selvagem nos conflitos,
Com ímpetos de fera
Nos olhos, saltos, gritos...
Horas jamais tranquilas,
Em brutos pugilatos
Fraturam-se as maxilas...
Compacta, recalcada,
Muito quietinho. A rir-me
De não me doer nada.
clepsydra
assírio & alvim
2003
 

Que música!
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