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31 agosto 2016

sebastião da gama / nos teus olhos



Nos teus olhos, aos poucos, vou achando
(de adivinhá-lo há rosas que sorriem)
quanto no mundo, aos poucos, fui perdendo…



sebastião da gama
cabo da boa esperança
ed. ática
1959




14 julho 2015

sebastião da gama / cansaço



Não quero amar nem ser amado…
Quero ficar estúpido e cansado
a este canto, e só.

Batido pelo Vento,
sem conforto, sem pão, sem alegria.

E se eu chamar não venhas.
(Que eu não hei-de chamar-te…)

No entanto, Amor, não saias para longe.
É que eu posso, apesar de tudo quanto digo,
chamar por ti.
E era tão bom saber que me escutavas!...
E era tão bom sentir que perdoavas!...



sebastião da gama
cabo da boa esperança
pecado original
ed. ática
1959



13 dezembro 2014

sebastião da gama / pus de parte a modéstia e o pudor



Pus de parte a modéstia e o pudor
e fui contando à Vida
tudo que tinha sido a minha vida.
Não ocultei sequer um pormenor.

Ora foi depois desta confissão
que ela se me deu nua, sem disfarces,
como se eu fora o seu primeiro homem…


sebastião da gama
cabo da boa esperança
ed. ática
1959




28 agosto 2014

sebastião da gama / céu



Tenho uma sede imensa,
mas não é de água...

Tenho uma sede imensa de beber
os soluços do Sol quando declina,
as carícias azuis do Luar de Agosto,
os tons rosa da Tarde que se fina...

É que eu seria poeta se os bebesse...
Não mais seria o cego de olhos limpos;
esse que viu a água e a não tocou,
pelo estranho pudor da sua boca
que um dia blasfemou.

E, se eu pudesse beber
esses longes de mim que vejo e quero,
em espasmos havia de os mudar
e, num desejo nunca satisfeito,
iria possuir-te, ó Mar!

Havia de cair, num beijo, sobre ti;
despir as minhas vestes de serrano,
tirar de mim aquilo que é humano,
e confundir-me em ti.

Gritem depois, embora, que eu morri;
alegre o Mundo o alívio do meu peso;
- que um dia o sol há-de surgir mais cedo
e o bom menino de olhos azuis,
de quem sou fraco arremedo,
há-de nascer, ó Mar, da nossa noite de Amor!

E tu, Menina que eu chamava,
Menina que eu chamava e encontrei
mas abrasada de amor divino
- tu hás-de ver então que o Céu que idealizas
é o olhar azul desse menino.



sebastião da gama
serra mãe
ed. ática
1996



06 fevereiro 2014

sebastião da gama / os que vinham da dor



Os que vinham da Dor tinham nos olhos
estampadas verdades crudelíssimas.

Tudo que era difícil era fácil
Aos que vinham da Dor directamente.

A flor só era bela na raiz,
o Mar só era belo nos naufrágios,
as mãos só eram belas se enrugadas,
aos olhos sabedores e vividos
dos que vinham da Dor directamente.

Os que vinham da Dor directamente
eram nobres de mais p´ra desprezar-vos,
Mar azul!, mãos de lírio!, lírios puros!

Mas nos seus olhos graves só cabiam
as verdades humanas crudelíssimas
que traziam da Dor directamente.



sebastião da gama
campo aberto
1951