20 março 2023

sylvia plath / canção da manhã

 




 

O amor acertou o teu passo como um pesado relógio de ouro.
A parteira deu-te duas palmadas nos pés e o teu grito nu
Tomou o seu lugar entre os elementos.
 
As nossas vozes em eco engrandecem a tua chegada. Estátua
     nova.
Na corrente de ar de um museu, a tua nudez
Encobre a nossa segurança. Rodeamos-te inexpressivos como
     paredes.
 
Sou tanto tua mãe como
A nuvem que em espelho se destila e nele vai reflectir o seu
     lento
Apagamento às mãos do vento.
 
Toda a noite a tua respiração de borboleta
Paira entre o cor-de-rosa murcho das roas. Acordo e oiço:
Move-se no meu ouvido um mar distante,
 
Um choro e saio da cama aos tropeções, vaca gorda e florida
Na minha camisa de noite vitoriana.
A tua boca abre-se limpa como a de um gato. O quadrado da
     janela
 
Empalidece e engole as estrelas sombrias. E tu agora ensaias
     a tua
Mão cheia de notas;
Claríssimas vogais elevando-se como balões.
 
 
 
sylvia plath
ariel
trad. maria fernanda borges
relógio d´ água
1996




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