30 dezembro 2014

valerio magrelli / comboio-cometa




" Assumia o autor, como fundamento da demanda, que no
seguimento da passagem de um comboio de mercadorias
deflagrara um incêndio, o qual, da via férrea, se propagara
à confinante propriedade desse autor, destruindo as culturas
existentes. Acrescentava que o incêndio fora provocado
por um vagão de comboio, de cujos travões, bloquea
dos apesar do movimento da composição, se tinham libertado
feixes de faúlhas. Do anexo relatório da oficina deduz-se
que, por causa do bloqueio do travão por obstrução
dos tubos devida a impurezas do óleo, as pastilhas e as
jantes do rodado ficaram fortemente incandescidas pelo
sobreaquecimento, e o chão do compartimento queimado."


Comboio-cometa
fósforo embruxado, ferro
riscado contra os carris,
travão puxado e atrito,
comboio-travão que dilacera
a guincha na noite.
Avançava com as rodas bloqueadas
as vértebras contraídas
as palavras-hífen
e do meu esforço saía
um calor e uma cor
e um cheiro a carne chamuscada:
faíscas, uma chuva de línguas
pedrenais na noite.
Ah vagões travados, ah palavras-hífen
eu fricativo, retrato de atrito.




valerio magrelli
a espinha do p
trad. rosa alice branco
poetas em mateus
quetzal
1993







1 comentário:

platero disse...

Gosto

obrigado